Copos D'água

Copos D'água

22 de julho de 2009

Ana era daquele tipo de mulher de flor no cabelo, mãos dóceis e voz suave. Gostava de sentar embaixo duma copa de árvore e ficar lá, ouvindo um pássaro qualquer enquanto lia um livo. Acho que podia fazer isso um dia todo, se quisesse. E Ana, como toda mulher, vaidosa que era, dizia ser bobeira de Vitor todos os elogios que ele insistia em repetir, às vezes dias a fio, sobre
o quão bela era.
_Pára com isso. -dizia- Não há assim mulher tão encantadora, nem alguém assim tão ingênuo a ponto de se enganar que haja. Se quer me tocar com tais palavras, pelo menos faça o favor de não tentá-lo todos os dias. As coisas repetidas assim tão facilmente perdem o valor.. Não quero ser uma bela-não-tão-bela daqui há algum tempo, pois assim é o que está fadado a acontecer. Se por acaso um beija-flor pousasse todos os dias na sua janela e ficasse lá por um bom tempo, tempo suficiente para que você pudesse o admirar plenamente, não haveria mais graça em fazê-lo. O beija-flor se tornaria algo corriqueiro, e passaria assim, a ser simplesmente parte da janela. Não quero que seus elogios sejam recorrentes como o beija-flor, nem que a beleza que eu possuo de fato, se torne como que rotina aos seus olhos.
E Ana assim se desfazia dos agrados, enquanto contrariava o coração.

3 de julho de 2009

de mim, a mim. sobre qualquer um.

Acende um cigarro, respira fundo. Espera as palavras saírem com calma da sua cabeça, elas vão encontrar uma ordem. Pode ser que façam sentido, quem sabe.. pode ser que não. O que faz sentido nessa vida, afinal? Nada faz.. as pessoas inventam sentidos pras coisas, significações. Aí o que não tem sentido não encontra compreensão. Assim como você mesma não encontrou, não vai encontrar..É sim, pedir muito que as pessoas te entendam, é quase impossível que alguém aceite que seja assim. O ser humano precisa de explicações, regras.. e quando você não oferece isso a ele, é o caos. Externo, interno.. na maior parte das vezes interno, quando se refere a algo ou alguém relacionado a você. Como você espera que as pessoas te acolham assim, desorganizada, desprendida? Um 'desprendida' mais ou menos, ainda.. que apesar de buscar o desprendimento, ainda não o atingiu, completamente. Essa sede de liberdade, esse sentimento de sufoco que te envolve quando você percebe que alguém criou uma mínima expectativa em relação a você.É difícil, mesmo.. sentir que você faz esperanças desmoronarem, futuros serem criados e esquecidos.. Mas calma.. Se ao menos alguém entendesse o quanto você também é humana e precisa de carinho.. um carinho despretensioso, um carinho assim, por si só. Ah, você daria tanto, mas tanto! Tudo que há dentro de você e um pouco mais.. Mudaria o mundo, moveria montanhas, por um sorriso, por alguém. Mas isso não existe.. porque quando você resolve saltar do penhasco e ir de cabeça na imensidão, alguém te puxa pela corda, e você acorda. A corda te prende, te limita. O que as pessoas não entendem é que você nunca iria embora, se a corda não existisse.. Elas não entendem que é exatamente a corda que faz você querer se afastar dali o mais rápido possível. É esse medo maluco de perder, essa angústia das pessoas, de esperarem uma recíproca da sua parte, que faz com que ela deixe de existir.Você, menina, previu os tropeços desde o começo, previu o fim, por mais que tivesse uma esperança de que ele não chegasse, e por mais que desejasse morrer ali, num abraço. Foi inevitável, como haveria de ser.. e o que deixa ainda mais claro que era inevitável, realmente, é a culpa que paira na sua cabeça, pelo término do caminho. A culpa que foi colocada ali, como se fosse você, e apenas você, o motivo, a desistência, o medo, a não-persistência. É isso que deixa claro que haveria realmente de chegar um fim.. pois o que é puro e real não deposita uma carga negativa como a culpa, sobre a pessoa dita 'amada'. Você sabe que não é alguém tão fácil de lidar, sabe que teve uma parcela nisso, mas não é responsável pelo fim, por completo. Isso não, nunca. E você, de jeito nenhum, diria isso da outra pessoa, também..O que é verdadeiro compreende, o que é verdadeiro, além de tudo, enxerga. E é isso, que desde o início da subida, faltou..e você sabia. Um olhar pra enxergar através, depois da cerca das coisas mundanas. Além das letras, além dos números...além de tudo isso que não tem valor nenhum, na verdade.. Mas que é exatamente a única coisa que as pessoas conseguem enxergar. Se existisse isso, ao menos..quem sabe hoje não faria frio.