Copos D'água

Copos D'água

10 de junho de 2010

Despedida em meias palavras

Já não enxergava as imagens da televisão há uns bons minutos.. para Ana, as legendas pareciam enormes borrões amarelos atravessando sua visão, e não formavam sentido algum. Sua cabeça estava distante dali, e focava no término de uma história onde ela era a protagonista. Virou para o lado, desprezando o enredo da tela à sua frente:
_Então.. como pretende fazer dessa vez? Pegar o carro e ir embora no domingo, mesmo...? (Eu queria arrancar isso de dentro de mim, orar tanto para que não fosse, e que nunca mais cruzasse aquela porta e me largasse aqui..)
_É, meus planos são de ir no domingo, logo depois do almoço.. (Mas meu peito teria outros planos pra mim, e pra ti, menina, se ele pudesse escolher. Me angustia tanto pensar em encher as malas, e deixar o vazio nos armários, dentro de ti..) O ruim mesmo é a preguiça de arrumar tudo logo depois de comer.
_Domingo à tarde, depois do almoço, dá mesmo aquela vontadezinha de deitar no sofá e não fazer mais nada, né.. (E como eu queria me deitar ao teu lado, segurar tua mão quente, e permanecer assim até a Lua aparecer no alto, brilhando pra nós, e tornando o tempo contigo, infinito..)
_Dá sim.. mas não encontro qualquer outro jeito.. Eu queria poder ficar mais um dia ou outro, ao invés de voltar e trabalhar na segunda, aproveitar também a calmaria do céu por aqui.. (E passar mais uma noite do teu lado, e acordar com a sensação do teu respirar no meu pescoço, sentir minha alma se arrepiar e formar com a tua uma coisa só, e te olhar dormindo.. e olhar, e olhar..)
_Que pena você ter que ir, sendo que quer ficar.. (Mundo tão penoso esse.. e essa despedida que sempre vem contra a minha vontade, e a minha falta de jeito pra te pedir pra não se esvair do meu lado, quando nem focar nas tuas pupilas eu consigo.. desvio o olhar pra aquela moeda no chão ao lado da porta, tomada de angústia, de dor. Enquanto você deve estar achando que eu não estou nem aí pra o que fala.. se ao menos você soubesse...)
_É.. uma pena, mesmo. (E só Deus sabe o quanto eu queria ficar aqui e te segurar forte perto de mim de novo e sentir teu beijo, e tua respiração ofegante, e o cheiro doce do teu cabelo.. mas não consigo nem pegar na tua mão e gritar o quanto te gosto! Não pense que eu não queria ficar aqui contigo.. não pense, por favor.)

(E a cor se esvai do meu mundo, e teus dedos se desfalecem nos meus, e eu sinto a angústia que os ponteiros me trazem e o silêncio mais aniquilante, depois do estampido tão dolorido da porta..)